terça-feira, 22 de março de 2016

Onda De Calor (Coup de Chaud, 2015)



Numa vila rural francesa abalada por um verão incrivelmente quente, o problema dos agricultores não se restringe à seca e às colheitas má-sucedidas. Um jovem completamente deslocado e excêntrico, com ataques de violência e comportamento errático (Karim Leklou) é visto com maus olhos pelos cidadães - especialmente num momento em que os nervos se encontram à flor da pele a partir de uma circunstância trágica ocorrida no decorrer do filme.

Este filme foi uma das melhores projeções oferecidas pelo My French Film Festival no início do ano. Ao longo de seus 102 minutos, o filme desperta um clima de tensão, especialmente pelas atuações de todo o elenco, mas cabe destacar o desempenho de Karim Leklou - absolutamente sensacional como Josef - o complexo jovem perturbado da sinopse. Sua atuação captura a agressividade e tensão que o personagem demanda, profundo demais para se classificar como bom ou ruim. Existem cenas em que seu personagem me despertou piedade extrema, enquanto outras me despertaram desconforto - uma atuação complexa, não centrada nos trejeitos e fisiologia externa de um distúrbio psiquiátrico, mas nas variações de comportamento de sua personalidade - seus momentos de tranquilidade/agressividade.


A obra tem um ritmo próprio e nada apressado - a tensão se constrói lentamente e tudo eclode no momento certo, de uma forma imbatível - a sensação de inevitabilidade é tenebrosa. A direção de Raphael Jacolout é discreta e eficiente, nos transportando perfeitamente para dentro da obra como observadores. Pelas lentes de Jacolout, somos cidadães sem voz desta aldeia, que aos poucos parece semear mais desconfiança, medo e injustiça do que qualquer outra coisa - é uma passividade monstruosa e cruel.

E a tensão crescente é muito bem acompanhada pela implacável aridez que a vila enfrenta - o sol e suas cores quentes conseguem oprimir, tanto quanto o frio desolador de A Caça (Jagten), um filme parecido em abordar a injustiça e os extremos que o ser humano pode chegar, frente uma cegueira moral. E quando a chuva finalmente chega, ela tem seu clássico elemento metafórico de renovação e purificação, que apesar de não ser uma novidade, funciona maravilhosamente bem. 


Não se trata de uma obra leve ou fácil de assistir, mas a sessão é extremamente compensadora, pela intensa reflexão que desperta (pelo menos despertou em mim). Ancorado por uma atuação arrebatadora e ótima direção, este é um filme que eu quero em minha coleção para rever quando eu quiser.

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