sexta-feira, 22 de abril de 2011

Um Dia de Cão (Dog Day Afternoon, 1975)


Um Dia de Cão começa de uma maneira incrivelmente tensa. Tudo que poderia dar errado num assalto a banco acontece com Sonny e Sal (Al Pacino e John Cazale, respectivamente), dois ladrões que são abandonados pelo terceiro comparsa, rendem um número bem maior de reféns e acabam despertando a atenção de transeuntes, o que ocasiona na rápida chegada da polícia ao local. O banco é cercado e os dois comparsas são obrigados a sustentar uma situação impossível para tentarem escapar da polícia. As negociações são tensas e você chega a acreditar que o impossível ocorrerá, mas em seu epílogo somos brutalmente surpreendidos pela realidade. E, como o pôster do filme já afirmava, o resto virou história.


Trata-se de um filme sobre um acontecimento extraordinário, que mudou por uma tarde a cidade de New York. Sonny tornou-se um herói para o povo durante uma tarde após sair do banco gritando "Attica! Attica!" – uma referência à rebelião ocorrida no presídio de Attica, em New York, que culminou na morte de 39 pessoas. Sonny pensava ter o controle da situação, cativando uma multidão de curiosos. Mas ele, bastante ingênuo, não percebeu que desde o momento que a polícia cercou o banco ele não tinha mais o controle da situação.



Acredito, aliás, que ingenuidade é a palavra que define Sonny e Sal. Na excelente atuação de Al Pacino, Sonny é um sujeito em ebulição, carismático; contudo, sua energia vai sendo apagada aos poucos, quando ele percebe que a situação em que se meteu foi a troco de nada. No terço final da obra ele diz que "está morrendo aos poucos". Isto é um fato, pois a medida que o tempo passa, a situação vai se esgotando, principalmente após a chegada do agente do FBI, Sheldon (James Broderick), que substitui o estabanado condutor das negociações, o detetive Moretti (Charles Durning). E a atuação de Pacino é precisa, pois vemos a exaustão e o desgaste que toma conta dele ao desenrolar da história. Sonny percebe, aos poucos, que não haverá volta para o que eles fizeram.


Já Sal é ingênuo, ignorante, fanático e, por tudo isso, perigoso. Logo no início da obra ele afirma a Sonny que está pronto para ir até o fim e, se precisar, matará os reféns, Vejo Sal como uma pessoa fácil de manobrar ideologicamente, disposto a fazer maldades se convencida a fazer isto, mas que não possui livre arbítrio algum. Por isso, chamo o personagem de ingênuo. E a interpretação de John Cazale é ótima também, pois desde sua postura corporal até seu visual passam várias impressões de seu personagem.


E nesse ponto devemos analisar a fantástica direção do mestre Sidney Lumet. O sentimento de tensão passado é perfeito – sentimos o nervosismo dos ladrões durante o tempo todo. Sem falar em como são traçados profundos perfis psicológicos de seus personagens com tão pouco. É claro que os excelentes atores escolhidos fizeram a diferença, mas o crédito por passar parte da carga emocional dos atores recai sobre Lumet. Sem falar nas cenas maravilhosas no interior do banco, tomadas em que Lumet mostrou seu domínio em lugares fechados (como mostrou no insuperável 12 Homens e uma Sentença).



Uma saborosa informação em torno de Um Dia de Cão é que o filme foi feito quase que inteiramente no improviso quanto aos seus diálogos. Cenas marcantes como Al Pacino gritando "Attica!", a conversa entre Al Pacino e seu amante (numa interpretação fenomenal de Chris Sarandon) e a resposta de Sal quando Sonny lhe pergunta para qual país ele gostaria de ir foram todas realizadas no improviso.


Mais uma curiosidade interessante é a participação de um jovem Lance Henriksen como um agente do FBI. Henriksen participou dos testes para o papel de Chris Sarandon, mas não foi escolhido para este papel.

Seu final frustrante é uma mostra de como a vida é realmente. Um dia de Cão é um verdadeiro patrimônio cinematográfico, um filme que pode ser chamado de perfeito. Apesar de não ter gostado muito do epílogo, creio que ele representa exatamente o que Sidney Lumet queria nos mostrar: existem momentos únicos na vida que, por mais incríveis que possam parecer, eles passam e a vida continua a revelia do destino de seus personagens principais.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Serpico (1973)


Com a morte do grande cineasta Sidney Lumet resolvi visitar alguns clássicos de sua respeitável filmografia. Por isso, não estranhem se nos próximos dias vocês virem várias críticas de filmes de Lumet no Midnight Drive-In.


Comecemos esta pequena jornada com o filmaço policial Serpico, sobre um tira honesto em New York que denuncia um esquema corrupto envolvendo colegas policiais. E, obviamente, o policial Frank Serpico (numa atuação excelente de Al Pacino) sofrerá várias consequências por ser aquele quem denuncia os desvios de seus semelhantes.



Trata-se de um filme com uma temática muito poderosa. E demorou muito para eu compreender as motivações de Serpico para que ele se expusesse tanto diante de seus colegas policiais. Existiriam homens dispostos a sacrificarem suas vidas em nome do que é justo? Serpico torna-se um mártir ao longo da projeção, mesmo que de maneira involuntária. Ele é o sujeito que sempre sonhou em ser policial e, quando entrou na corporação e viu a podridão que a cercava, resolveu denunciar os policiais corruptos e o descaso de seus superiores em investigar os tiras sujos.


Esse esplêndido dilema moral persegue Serpico durante o filme inteiro. E Sidney Lumet expressa isto com maestria, junto, claro, da atuação muito boa de Al Pacino – um homem que tenta lutar contra um sistema desonesto. A trilha sonora, bastante dramática, fica em sintonia com o tom da obra.


É interessante reparar em como os filmes de Lumet possuem uma carga moral sempre intensa. A única obra que eu tinha assistido dele (12 Homens e Uma Sentença) e Serpico são semelhantes no que diz respeito a busca por justiça de seus personagens principais. Em 12 Homens, Henry Fonda procura fazer o julgamento justo como um jurado num caso de assassinato; Serpico procura fazer um bom trabalho como policial, de maneira honesta e digna.



Serpico (o filme) contém várias cenas interessantes. Filmado em New York, o filme tem um clima de policial urbano e decadente muito condizente com o espírito da obra. Entre os momentos mais marcantes, temos o momento em que Serpico irá prender um agiota que é amigo dos policiais sujos, a cena em que ele é baleado e a cena do hospital, em seu epílogo, quando Al Pacino mostra porque é um dos melhores atores de todos os tempos.


Sidney Lumet nos apresentou, enfim, um filme policial muito bom, com um intenso diálogo moral. Apesar de não ser um filme superpremiado (coisa que, no final das contas, não significa nada), Serpico é um dos clássicos do cinema norte-americano. Muito bom mesmo.

Red - Aposentados e Perigosos (Red, 2010)


Posso contar nos dedos de uma das mãos o número de vezes que fui ao cinema durante o ano passado. E, de todos os filmes do ano passado, afirmo, com folga, que Red foi o que mais me surpreendeu e me divertiu.


E como é bom quando somos surpreendidos pelas qualidades de um filme! É justo e correto afirmar que Red não traz absolutamente nenhuma novidade para o mundo do cinema. Todavia, Red apresenta um elemento raro nas superproduções hollywoodianas: um elenco perfeito e em total sintonia com o espírito da obra.


Incrível como o grupo de atores escolhidos faz seu trabalho incrivelmente bem, sem excessos ou canastrice, numa obra que poderia dar margem a estes defeitos. A estória é muito simples, sobre ex-agentes da inteligência americana que, após terem se aposentado, são ameaçados de morte em razão de um segredo de um político americano do alto-escalão.


Todos estão muitíssimo bem, mas gostaria de destacar Karl Urban, que é dos melhores atores de sua geração. Aqui, ele consegue criar simpatia num personagem que, inicialmente, sentimos raiva. Mary-Louise Park também está uma graça como a mocinha do filme.


O restante do elenco desempenha seus papeis com perfeição. Bruce Willis reprisa, de maneira eficiente, o papel de cara durão; Helen Mirren esbanja charme como uma assassina cheia de classe; Morgan Freeman é o experiente e gaiato assassino; John Malkovich é o matador pirado e paranoico; Brian Cox e Richard Dreyfuss completam esse timaço de atores. Ah! E como se esquecer de Ernest Borgnine como o guardião dos arquivos da CIA.


Red é um dos filmes mais divertidos que eu já assisti. Um exemplo perfeito de como um filme-pipoca deve ser: divertido, descompromissado e bem feito. Sem dúvida, uma surpresa muito agradável.

domingo, 17 de abril de 2011

Cisne Negro (Black Swan, 2010)


Até, mais ou menos, a metade do filme, estava achando Cisne Negro tão morno quanto sua protagonista Nina (Natalie Portman), uma inocente bailarina que ganha o papel principal na peça O Lago dos Cisnes. A moça é perfeita para ser a Rainha dos Cisnes, porém como Cisne Negro a moça não convence. E à medida que ela mergulha mais fundo em busca de seu próprio lado negro, embarcaremos num espiral de loucura, medo e tensão magistralmente filmados por Darren Aronofsky e personificados intensamente por Natalie Portman.


Não pretendo fazer uma resenha longa, pois Cisne Negro já foi exaustivamente analisado em toda blogosfera. Devo dizer que se trata de um trabalho realmente diferenciado, mas como mencionei anteriormente, que realmente decola em seu epílogo, no momento da apresentação d'O Lago dos Cisnes.


Fato é que certas pessoas precisam de um gatilho para a loucura tomar conta de suas vidas e Nina encontra seu gatilho nas pressões do diretor de balé (Vincent Cassel, que está excelente) e na inveja de suas colegas bailarinas (encabeçadas por Mila Kunis). Nina consegue atingir o seu lado negro, mas a que custo? Creio que esta é, afinal, a grande mensagem do filme: a loucura só precisa de um estímulo para tomar conta da vida de uma pessoa.


Cisne Negro é um grande filme, cheio de tensão e beleza. Não é, de forma alguma, o melhor filme de Aronofsky, mas trata-se de uma sólida realização numa carreira esplêndida. Sem dúvida, Aronofsky é um dos grandes!

sábado, 9 de abril de 2011

O Turista (The Tourist, 2010)


Um filme formidável. O Turista parece ter saído das páginas de um livro de um bom livro de espionagem, com sua trama envolvente e ritmo agradável. A estória é contada pelo diretor Florian Henckel von Donnersmarck sem solavancos, com tomadas belas e fotografia perfeita, tendo como pano de fundo Veneza. O casal Angelina Jolie e Johnny Depp desempenham seus papeis com segurança, revelando uma química surpreendente e crível entre os dois.


O filme tramita entre o assumido thriller de espionagem com pitadas de humor, me lembrando, em alguns momentos, o sensacional e superior A Casa da Rússia. Aqui, os agentes da inteligência são tratados com uma comicidade discreta, simbolizados, especialmente, pelo estabanado agente vivido por Paul Bettany.


Não temos desempenhos memoráveis ou um final surpreendente (pelo menos para mim...). O que O Turista nos reserva é uma estória bem contada aliada a uma produção requintada e uma direção segura e cheio de estilo. Para alguns isto é pouco, mas dada as últimas safras hollywoodianas, um filme com estes elementos positivos já bastam para mim.

In Memorian: Sidney Lumet (1924-2011)

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Apocalipse Now (Apocalypse Now, 1979)


Difícil escapar do clichê quando se pretende falar sobre um filme tão cultuado e analisado como Apocalypse Now. Provavelmente, o exemplar mais delirante sobre o horror da guerra, a obra de Francis Ford Coppola tornou-se uma lenda no mundo cinematográfico pelas dificuldades enfrentadas durante sua produção. Orçamento estourado, prazos desrespeitados, problemas com os atores (o famoso descaso de Marlon Brando com a obra) e inúmeros reveses pontuaram o filme, de tal maneira que estes foram refletidos para o filme, tornando Apocalypse Now num filme exaustivo e, em alguns momentos, genial.

Trata-se de um filme carregado, por vezes incompreensível e alucinado. Não há como negar: a obra é, de fato, um clássico. Entretanto, Apocalypse Now justifica um bordão famoso de maneira adequada: às vezes, menos é mais...

Apocalipse reflete perfeitamente a geração dos anos 70, a energia, ainda latente, dos movimentos estudantis contra a guerra, aliada ao auge do consumo de drogas lisérgicas, vindas dos anos 60.

Existe uma mensagem muito clara em Apocalipse Now, mas esta chega de maneira simbólica e, por vezes, incompreensível. Como explicar, por exemplo, o epílogo, quando Willard (Martin Sheen) finalmente encontra o coronel Kurtz (Brando), numa espécie de reino encravado na floresta – esta parte da obra soa, inicialmente, deslocada e estranha. Mas por se tratar de uma guerra tão sem sentido, como foi o Vietnã, é natural que uma loucura como esta desfile pela tela.

E é interessante ver como Apocalipse Now constrói e desconstrói o gênero de guerra neste filme. Impossível esquecer o ataque de helicópteros ao som da Cavalgada das Valquírias, uma das cenas mais marcantes da história do cinema; ela mostra a face óbvia deste filme, a guerra e sua grandiosidade/destruição. E boa parte do filme foca suas lentes sobre as pessoas que participam da batalha: jovens tolos, loucos, homens medrosos e pessoas que perderam sua fé na própria vida (que é o caso do capitão Willard). Pensava-se que guerras eram feitas com homens bravos, mas como sustentar esta tese após a cena em que um barco de civis é metralhado por soldados americanos...

E é por momentos de intensa análise emocional como este que considerei Apocalipse Now um grande filme, um marco. E o filme segue bem até o seu final. O fim da busca de Willard por Kurtz representa o ápice da incompreensão ante esta guerra. Kurtz é considerado um lunático pelos oficiais americanos, mas estes não seriam loucos também por aceitarem o sacrifício de vidas numa luta sem sentido?

Falando nos aspectos mais óbvios do filme, o clímax marca a decepção de minha parte quanto a presença de Marlon Brando, que soa deslocada e desleixada. Uma atuação, francamente, medíocre, considerando a carreira deste grande astro.

Assim, Apocalipse Now projeta-se como uma das obras mais poderosas já criadas por um diretor. Contudo, ela poderia ser um pouco mais acessível, para nós, seres mortais, que muitas vezes só querem assistir algo que possamos compreender. Mas, pensando bem, como entendermos algo tão atroz e vergonhoso como a Guerra do Vietnã? Não tem explicação...

domingo, 3 de abril de 2011

Tiras em Apuros (Cop Out, 2010)


Quando se reúnem vários talentos num mesmo projeto, é natural que as expectativas sobre o mesmo sejam muito altas. No caso de Tiras em Apuros, uniram-se um diretor/roteirista muito talentoso, exímio criador de diálogos engraçados e inteligentes (Kevin Smith), e um grande astro de filmes de ação (Bruce Willis) para fazerem, juntos, um filme de dupla policial. O resultado é um filme divertido, com boas ideias e algumas atuações ótimas, mas que fica aquém do esperado devido os nomes envolvidos na obra.


Mas, na contramão das inúmeras críticas negativas, eu afirmo que o filme é bem legalzinho e me agradou bastante durante sua projeção. A começar por sua trama inusitada que envolve a dupla policial (Willis e o comediante Tracy Morgan) em busca de uma figurinha rara de colecionador, daqueles cards com um jogador de baseball. Eles acabam se envolvendo com um bandidão latino que adora baseball (Juan Carlos Hernández) e que está relacionado com uma série de assassinatos.

Tiras em Apuros segue a cartilha dos filmes de dupla policial, mas falha no elemento principal dos filmes do gênero: a dupla não tem entrosamento. Willis e Morgan não possuem sintonia alguma e não soam críveis como parceiros. Difícil dizer de quem é a culpa, mas acho que ela recai no roteiro, pois há poucas cenas em que você acredita numa amizade entre os dois policiais.


Mas isso não significa que os protagonistas estejam ruins. Willis não se destaca, mas Tracy Morgan está muito engraçado, especialmente nas cenas em que ele aparece sozinho (como no início do filme, quando ele arranca a confissão de um sujeito). O filme ainda traz
Kevin Pollak e Adam Brody como outra dupla policial (que em certos momentos é mais engraçada que a dupla principal) e um Seann William Scott simplesmente hilário como um bandido pé-de-chinelo que tem a mania irritante de repetir o que os outros falam; ele é o dono das melhores cenas do filme, principalmente aquela em que ele irrita Tracy Morgan no carro.



É interessante ver que este é o primeiro filme dirigido por Kevin Smith que ele não escreveu. E a maior falha de Tiras em Apuros é seu roteiro mediano, com várias boas ideias que resultariam num ótimo filme, se fossem sustentadas por uma base mais eficiente. Os personagens principais poderiam ser mais bem construídos, assim como a relação entre eles, tornando a estória mais crível e envolvente. É nessas horas que você percebe como Shane Black (roteirista de Máquina Mortífera e outros filmes de duplas policiais) é um mestre do gênero. O mais intrigante é que este roteiro estava na Black List de 2008 (lista dos melhores roteiros não produzidos daquele ano).


Mas, mesmo entre inúmeros erros e acertos, Tiras em Apuros ainda me divertiu, principalmente pelas suas boas ideias e por eu adorar filmes de dupla policial. Poderia ser bem mais legal, mas ainda diverte pra caramba.