Recentemente eu assisti uma grande quantidade (pelo menos para os meus padrões) de filmes e programas de TV envolvendo o ambiente prisional. Assisti nos cinemas o insosso Luta Por Justiça e me diverti com o programa Beyond Scare Straight (com adolescente problemáticos passando uma temporada numa prisão real), do famigerado canal A&E. Contudo, de todos os entretenimentos assistidos, o que eu mais gostei, por diversos motivos, foi a revisão do telefilme RÉU PRIMÁRIO, de 1997.
Sim, uma revisão de um filme que eu assisti na época de seu lançamento em nossas locadoras. Tenho a vívida memória da fita VHS acima, assim como de seu pôster estampado na locadora Hélio's Vídeo, que nós frequentávamos com bastante assiduidade. Um misto de surpresa e nostalgia me atingiram quando descobri na internet uma cópia dublada deste filme, a qual prontamente assisti.
Dessa forma, segue-se um alerta: existe uma possibilidade real de ter apreciado este filme não só por suas qualidades existentes, mas pelas ótimas sensações despertadas por ele. Quem acompanha meus parcos textos sabe da saudade que eu sinto das locadoras, fitas VHS e de como era ser cinéfilo nessa época de menor abundância de títulos e informações, mas maior importância.
A fita RÉU PRIMÁRIO foi dirigida por Charles S. Dutton, mais conhecido por sua carreira como ator em filmes como Alien 3, Tempo De Matar, Na Companhia do Medo e diveros seriados televisivos. Segundo a revista SET, de Março de 1998, o próprio ator é ex-presidiário, personalizando ainda mais sua primeira experiência como diretor.
A obra acompanha a história real de Greg Yance, traficante da gangue Vice Lords condenado a 5 anos de prisão com a opção de frequentar um acampamento militar de reabilitação por 120 dias, justamente por ser um réu primário. Nesses 4 meses, além da experiência com a rígida disciplina do acampamento, Greg lidará com colegas de gangues rivais, um sargento linha duríssima (ótima interpretação de Delroy Lindo) e a atuação voluntária desses presidiários para tentar conter as inundações de Mississipi, ocorridas em 1993.
Felizmente, o elenco é muito bem escolhido. O personagem principal é interpretado por Omar Epps, que muitos anos mais tarde faria bastante sucesso no excelente seriado House. Sua performance não cai na armadilha de soar afetada ou vitimista. Assim como Delroy Lindo, que esculacha (com razão) os jovens presos, por entender que seus delitos (especialmente o tráfico) destroi não apenas a vida deles próprios como a de outros negros pobres e de famílias desestruturadas. Rachel Ticotin também participa como uma das superiores do acampamento.
É profundamente recompensador o fato de RÉU PRIMÁRIO não ser explicitamente panfletário ou vitimista, como muitas obras mais atuais insistem em ser. Para uma parcela considerável de pessoas, um acampamento militar como o do filme não "endireita" um bandido, mas ainda permanece como uma opção de resgate dessas pessoas. Consoante a essa temporada, Greg testemunha os esforços de uma pequena cidade em evitar o alagamento da sua comunidade. A montagem da cena, misturando algumas imagens reais da National Geographic com o trabalho na montagem de barragens é muito eficiente. Destaca-se também a bonita trilha sonora do compositor Joseph Vitorelli - sem outros destaques em seu currículo - cujo trabalho se sobressai nestas cenas.
Apesar do baixo orçamento (percebido especialmente nas cenas iniciais do personagem na prisão) este telefilme mantém um ótimo padrão de qualidade em sua produção, algo rotineiro nos filmes feitos para a HBO. No Brasil, você só encontra esse filme em formato VHS, mas nos Estados Unidos há um lançamento em DVD, não tão simples de se encontrar (pelo menos em minhas primeiras buscas).
Enquanto eu revia RÉU PRIMÁRIO, foi impossível não ser atingido por uma nostalgia, referente a como o nosso mercado de vídeo já foi muito rico, com bons lançamentos fora do circuito dos cinemas comerciais. Logicamente, era mais difícil ter estes filmes, a não ser que se fizesse uma cópia da fita da locadora ou desse sorte de gravá-la se fosse exibida na televisão (não tenho informações se este filme chegou a ser exibido em TV aberta, mas se algum dia foi exibido, eu apostaria que foi no SBT). Omar Epps e Delroy Lindo foram dublados por Gabriel Noya e João Ângelo, respectivamente.
Não é uma fita simples de se encontrar por aí, mas fica a sugestão de um ótimo telefilme, completamente esquecido e que merecia ser mais assistido. Agora, eu inicio a busca deste filme para minha filmoteca, onde certamente tem seu espaço garantido.