Nos últimos anos venho observando em mim mesmo uma resistência referente a como a violência é mostrada em um filme. Para mim, é preciso haver algum sentido nela, algo por trás do simples choque, especialmente se pensarmos nos horrores da vida real. Entendam que eu ainda adoro filmes extremos e a ideia de cineastas quebrando barreiras para exibir cenas chocantes dentro de uma narrativa; minha mais recente aquisição em Blu-ray foi uma cópia de Der Todesking - quem gosta de cinema bizarro provavelmente já está familiarizado, mas se este não for seu caso, uma hora dessas publico uma resenha deste filme por aqui.
Dito isso, temos o tão comentado THE SADNESS o qual conferi ontem à noite. Uma cidade em Taiwan é assolada por um surto de uma estranha doença que transforma os afetados em canibais e sádicos - uma epidemia de violência. A história acompanha um casal que busca sobreviver diante dessa calamidade, tentando se reencontrar para fugirem dali.
A tal epidemia é a desculpa para se mostrar uma quantidade inacreditável de sangue e loucura: bebês em saco de lixo, suicídios, perfurações com os mais diversos instrumentos, atropelamentos, olhos extirpados, estupros e muito mais. O cardápio de atrocidades é gigantesco e mostrado sem frescura durante a projeção. Entretanto, a coleção de ideias grotescas mostrada neste filme me passa uma sensação de que o roteirista e diretor Rob Jabbaz pensou em como encaixar cenas visualmente impressionantes com um fiapo de história.
Sim, é um fiapo de história. Ele até tenta colocar umas explicações perto do final e alguma densidade em suas críticas, entretanto não há substância alguma. Há críticas em relação aos políticos que não sabem enfrentar uma crise (a cena da coletiva de imprensa é a pior do filme, até pela qualidade técnica muito abaixo da mostrada ao longo da sessão), a desinformação, a descrença em relação a condutas médicas e científicas em geral (como se não houvesse motivo para tal, especialmente fazendo-se um paralelo com nossa realidade recente); tais críticas não são colocadas como uma reflexão, mas sim como postulados e, dessa forma, soam esvaziadas como o discurso de universitários "revolucionários".
Uma cena que ilustra bem essa argumentação pobre é o início da cena do metrô, onde a personagem principal, Kat, é incomodada por um senhor que tenta puxar papo e se mostra extremamente inconveniente. A resposta da personagem é ameaçar denunciar o personagem como assediador, o que o leva a ficar resmungando sobre como as mulheres hoje em dia se comportam de uma forma injusta, porque ele apenas estava conversando com ela. Há um óbvio subtexto feminista aqui, especialmente considerando que, sem surpresa nenhuma, o tal senhor é infectado e se torna um dos grandes vilões do filme.
O que me incomoda é o seguinte: se Kat considerou a conduta do senhor imprópria, talvez ela devesse ter denunciado o cara e não ameaçado, mantendo-se ao lado dele no metrô. A cartada do "vou te denunciar por assédio" é inacreditavelmente utilizada mais uma vez no filme, quando ela precisa do celular emprestado de um "virjão", cujo pano de fundo é uma personagem peituda de anime. E, claro, esse infeliz acaba tendo um destino pra lá de sangrento.
No final das contas, eu acho que acabei por entender a razão do título do filme ser A tristeza. Nós somos quase que como essas bestas feras do filme, apenas a um gatilho de explorarmos as mais diversas formas de violência possíveis de se imaginar. E essa conclusão niilista do diretor é, sem nenhum exagero, algo extremamente depressivo de se concluir após seus enxutos 90 minutos de duração.
Diante de suas mensagens vazias, sobram as cenas de violência que são tecnicamente interessantes e cheias de sangue, uma maquiagem muito decente em sua maioria. Mas é só isso mesmo. Lembram daquele filme Fim dos Tempos do Shyamalan? Para mim, esse aqui é aquele mesmo filme, porém bem mais porra louca.